Teste sanguíneo permite detecção de tumores cerebrais, aponta estudo.
Pesquisadores no Canadá e nos Estados Unidos, sob coordenação do imunologista brasileiro Daniel Diniz de Carvalho, do Princess Margaret Cancer Centre, afiliado à Faculdade de Medicina da Universidade de Toronto, desenvolveram um teste capaz de identificar e classificar diferentes tipos de tumores cerebrais a partir de análises de amostras de sangue, permitindo um diagnóstico mais preciso e um planejamento adequado em relação às principais formas de tratamento disponíveis.
O novo teste baseia-se na identificação do padrão de metilação de fragmentos de DNA lançados pelas células, sadias ou tumorais, na corrente sanguínea —o chamado DNA circulante (ctDNA). A metilação é uma das modificações químicas mais comuns sofridas pelos genes. Nela, um grupo metila, formado por um átomo de carbono e três de hidrogênio (CH3), liga-se a um trecho do DNA da célula, impedindo que seja lido pelo seu maquinário.
Essa alteração garante que todas as células, apesar de compartilharem a mesma informação genética, desenvolvam características próprias e se especializem em funções distintas, a depender do tecido em que estão localizadas. Esse processo resulta em marcas químicas no genoma, que, em conjunto, formam um padrão de metilação, uma impressão digital do DNA das células no organismo.
Há algum tempo Carvalho trabalha no desenvolvimento de uma estratégia de monitoramento e identificação de padrões de metilação de ctDNA. Um dos desdobramentos dessas pesquisas foi uma biópsia líquida capaz de detectar precocemente diferentes tipos de tumores.
Agora, em colaboração com a neurocientista canadense Gelareh Zadeh, ele e sua equipe aplicaram essa estratégia à identificação de tumores intracranianos. O diagnóstico desses tipos de câncer envolve um processo complexo que hoje se dá por meio de técnicas cirúrgicas bastante invasivas, a partir das quais os médicos obtêm amostras de tecido cerebral para análise molecular.
“Não é possível diferenciar os tumores cerebrais nem saber se aquilo que estamos vendo na tomografia computadorizada diz respeito a um carcinoma mais ou menos agressivo”, ele explica. “À primeira vista, todos são muito parecidos, daí a necessidade de biópsias, um procedimento extremamente invasivo e caro.”
No estudo, publicado no dia 22 de junho na revista Nature Medicine, os pesquisadores coletaram amostras de sangue de 221 pessoas com diferentes tipos de tumores intracranianos. Em seguida, separaram o plasma sanguíneo e localizaram os fragmentos metilados de ctDNA.
Após sequenciarem esses fragmentos e identificarem suas células de origem, estabeleceram padrões, associando-os a cada tipo de tumor. “Os padrões de metilação de ctDNA de células de um glioma são diferentes dos de um meningioma, ou de um tumor glioneuronal, por exemplo.”
Essas informações foram convertidas em dados e incorporadas a um sistema computacional. Com base nessas informações, o sistema conseguiu identificar e diferenciar os subtipos de tumores intracranianos em 97% dos casos a partir de novas amostras de sangue de indivíduos ainda sem diagnóstico definido.
Segundo Carvalho, a nova ferramenta representa um avanço importante em relação aos atuais métodos de diagnóstico de tumores cerebrais, uma vez que permite identificar e classificar diferentes tipos sem a necessidade de biópsias.
“Se soubermos de antemão que determinado tumor é menos agressivo, não serão necessárias nem a biópsia nem a cirurgia para sua retirada”, explica o imunologista.
Os pesquisadores esperam agora ampliar a capacidade de análise do novo sistema, inserindo novas amostras de padrões de metilação de ctDNA de células oriundas de outros tipos de tumores. A proposta é criar um consórcio internacional de universidades e hospitais, de modo que os pesquisadores possam ter acesso a amostras de tumores mais raros.
Apesar do avanço, ainda levará algum tempo até que a nova ferramenta possa ser usada clinicamente nos hospitais. Os pesquisadores ainda precisam validar o sistema em amostras maiores de pessoas, o que deverá ser feito nos próximos meses. Segundo Carvalho, depois, a tecnologia ainda precisará ser aprovada pelos órgãos reguladores oficiais.
Fonte: Uol.